Texto: Micheliny Verunsck, Ovelha Pop.
O título do filme gritou essa pergunta para mim na prateleira da videolocadora e, depois de um turbilhão de lembranças comprimidas em alguns segundos, eu disse a mim mesma: ok, sei que vou chorar, mas preciso ver esse filme.
Por trás da pergunta sugestiva que dá título ao filme dirigido por Anand Tucker em 2007, está a história real do poeta e crítico literário britânico Blake Morrinson e do seu pai, Arthur. E qual é a história? Após a notícia de que seu pai sofre de um câncer devastador, Blake (interpretado por Colin Firth) revê a trajetória da sua relação com o pai, um sujeito pouco convencional e por vezes politicamente incorreto, com quem viveu uma relação conturbada mas nem por isso menos amorosa.
Pequenas trapaças, piadas mal colocadas, uma amante onipresente são as coisas que, num primeiro momento, aparecem com maior relevo a respeito do cárater de Arthur (o sensacional Jim Broadbent). Porém se fosse apenas isso o personagem seria "chapado", desenhado numa única tonalidade. Mas ao contrário, Arthur é também, e apesar das suas contradições, um homem com virtudes inquestionáveis e no qual se percebe um amor incondicional pela família e por aquele filho que nem sempre compreende em suas escolhas (por que Blake escolheu ser poeta e não médico, como pai, por exemplo).
É um filme sobre o amor, seus encontros e seus desencontros. E é também um filme que fala como o impacto da morte de um ente querido nos leva a uma viagem de volta ao passado, tanto aquele mais recente quanto o passado mais remoto. O que poderia soar como clichê num filme com essa temática é anulado diante de uma narrativa que opta por uma certa fusão entre o passado e o presente, quase uma simultaneidade entre os fatos. Daí que numa mesma cena teremos o olhar de Blake adulto, jovem e criança, numa superposição muito competente de tempo e de desdobramento de personagem. Destaque ainda para as atuações de Matthew Beard (Blake adolescente) e de Juliet Stevenson.
Fotografia e trilha sonora complementam a delicadeza desse filme que trata a morte com toda a emoção que o tema pede sem, no entanto, se derramar no melodrama. O aspecto ao mesmo tempo reverente e corriqueiro colocam o fato inexorável no lugar a que ele pertence, o cotidiano da vida.
O filme é tocante e a pergunta se refere à última vez em que você, espectador, viu o seu pai com toda a potencialidade de suas virtudes e defeitos por uma última vez.
É a pergunta que eu também faço ao leitor desse blog, se ele se sentir à vontade para responder, é claro:
Quando você viu o seu pai pela última vez?
Eu perdi o meu pai em outubro passado. E antes que ele morresse eu o vi ainda em duas ocasiões. A primeira, durante uma semana num hospital em Recife e a última vez, também pelo mesmo período de tempo, num hospital em Arcoverde. Mas a última vez em que o vi de verdade, a última vez em que ele ainda estava lá, foi quando fiquei com ele numa tarde pontuada de algumas conversas, algum silêncio, e na qual ele me orientou em coisas práticas para o auxiliar. Ele havia saído quase que por milagre da UTI depois de uma sequência absurda de cirurgias.
Um mês depois, o pai que vi de memória oscilante e para o qual eu disse um "eu te amo" de despedida, não era aquele pai de sempre, tão senhor de si e sempre tão forte. Era esse um pai já em caminho, já de viagem.
O pai que eu toquei no caixão, já não era, já não estava.
De tudo fica o pai que tento reconstruir com os fragmentos da memória desde então. O pai que permanece e que paradoxalmente fragmentário nem por isso é menos inteiro. Um pai quase que onipresente em tudo o que faço e às vezes me pego ouvindo na minha voz a tonalidade da voz dele.
Sinto saudades.
Pequenas trapaças, piadas mal colocadas, uma amante onipresente são as coisas que, num primeiro momento, aparecem com maior relevo a respeito do cárater de Arthur (o sensacional Jim Broadbent). Porém se fosse apenas isso o personagem seria "chapado", desenhado numa única tonalidade. Mas ao contrário, Arthur é também, e apesar das suas contradições, um homem com virtudes inquestionáveis e no qual se percebe um amor incondicional pela família e por aquele filho que nem sempre compreende em suas escolhas (por que Blake escolheu ser poeta e não médico, como pai, por exemplo).
É um filme sobre o amor, seus encontros e seus desencontros. E é também um filme que fala como o impacto da morte de um ente querido nos leva a uma viagem de volta ao passado, tanto aquele mais recente quanto o passado mais remoto. O que poderia soar como clichê num filme com essa temática é anulado diante de uma narrativa que opta por uma certa fusão entre o passado e o presente, quase uma simultaneidade entre os fatos. Daí que numa mesma cena teremos o olhar de Blake adulto, jovem e criança, numa superposição muito competente de tempo e de desdobramento de personagem. Destaque ainda para as atuações de Matthew Beard (Blake adolescente) e de Juliet Stevenson.
Fotografia e trilha sonora complementam a delicadeza desse filme que trata a morte com toda a emoção que o tema pede sem, no entanto, se derramar no melodrama. O aspecto ao mesmo tempo reverente e corriqueiro colocam o fato inexorável no lugar a que ele pertence, o cotidiano da vida.
O filme é tocante e a pergunta se refere à última vez em que você, espectador, viu o seu pai com toda a potencialidade de suas virtudes e defeitos por uma última vez.
É a pergunta que eu também faço ao leitor desse blog, se ele se sentir à vontade para responder, é claro:
Quando você viu o seu pai pela última vez?
Eu perdi o meu pai em outubro passado. E antes que ele morresse eu o vi ainda em duas ocasiões. A primeira, durante uma semana num hospital em Recife e a última vez, também pelo mesmo período de tempo, num hospital em Arcoverde. Mas a última vez em que o vi de verdade, a última vez em que ele ainda estava lá, foi quando fiquei com ele numa tarde pontuada de algumas conversas, algum silêncio, e na qual ele me orientou em coisas práticas para o auxiliar. Ele havia saído quase que por milagre da UTI depois de uma sequência absurda de cirurgias.
Um mês depois, o pai que vi de memória oscilante e para o qual eu disse um "eu te amo" de despedida, não era aquele pai de sempre, tão senhor de si e sempre tão forte. Era esse um pai já em caminho, já de viagem.
O pai que eu toquei no caixão, já não era, já não estava.
De tudo fica o pai que tento reconstruir com os fragmentos da memória desde então. O pai que permanece e que paradoxalmente fragmentário nem por isso é menos inteiro. Um pai quase que onipresente em tudo o que faço e às vezes me pego ouvindo na minha voz a tonalidade da voz dele.
Sinto saudades.
Mi.
3 comentários:
Vi meu pai pela última vez 4 meses atrás...
Estava me dizendo tchau na iminência de minha vida matrimonial...
Já vi meu pai pela última vez muitas vezes...
Me emocionei de mais com seu post...
Meu pai ainda não se foi... mas moramos longe... trabalhamos juntos durante 8 anos e depois desse tempo me mudei para SP... e toda minha amada família ficou em MG... Sinto saudades, mas com certeza é uma saudade diferente...
Um grande abraço!
http://carameloscrap.blogspot.com/
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