sábado, 26 de julho de 2008

Torquato Neto, nos últimos antes de vida, visitava mais constantemente Teresina (PI), numa espécie de despedida fragmentada. Em uma dessas viagens feita em 1970, é apresentado a Durvalino Couto Filho, 17 anos, então estudante do segundo grau, e a Edmar Oliveira pelo primo Paulo José Cunha que, com Fátima Mesquita, agendam com ele uma entrevista para a página Comunicação, que editavam no jornal Opinião. A entrevista saiu na edição do dia 31 de janeiro de 1971, marcando, a partir daí, a participação de Torquato Neto na página Comunicação, que circulava desde o dia 19 de março de 1970. Nela, foram publicados, pela primeira vez, alguns dos textos que viriam a formar a composição de Os Últimos Dias de Paupéria, como, por exemplo:
MARCHA À REVISÃO1 – COLAGEM - Quando eu a recito ou quando eu escrevo, uma palavra - um mundo poluído - explode comigo e logo os estilhaços desse corpo arrebentado, retalhado em lascas de corte e fogo e morte (como napalm) espalham imprevisíveis significados ao redor de mim: informação. Informação: há palavras que estão nos dicionários e outras que não estão e outras que eu posso inventar, inverter. Todas juntas e à minha disposição, aparentemente limpas, estão imundas e transformaram-se, tanto tempo, num amontoado de ciladas.
Uma palavra é mais do que uma palavra, além de uma cilada. Elas estão no mundo e portanto explodem, bombardeadas. Agora não se fala nada e tudo é transparente em cada forma; qualquer palavra é um gesto e em sua orla os pássaros de sempre cantam nos hospícios. No princípio era o verbo e o apocalipse, aqui, será apenas uma espécie de caos no interior tenebroso da semântica. Salve-se quem puder.
As palavras inutilizadas são armas mortas e a linguagem de ontem impõe a ordem de hoje. A imagem de um cogumelo atômico informa por inteiro seu próprio significado, suas ruínas, as palavras arrebentadas, os becos, as ciladas. Escrevo, leio, rasgo, toco fogo e vou ao cinema. Informação? Cuidado, amigo. Cuidado contigo, comigo. Imprevisíveis significados. Partir pra outra, partindo sempre. Uma palavra: Deus e o Diabo". (Reproduzido no Geléia Geral - 8/11/71. 6ª feira).

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