sexta-feira, 25 de abril de 2008

Aí vai meu coração

As cartas de Tarsila do Amaral e Anna Maria Martins para Luis Martins

Foi um triângulo. A obra da Tarsila escrita era acanhada. De poucas palavras deixadas, vê-se cores carregadas. Na desigualdade da vida, naquele tempos (meados de 30) heranças e paixões eram casos sérios e os casos amorosos não podiam, nem deveriam, ser revelados.

Tudo foi trancado à 7 chaves. Mas, a importância de Tarsila na vida de Luis Martins não foi mero acaso. Por muitos anos, mantiveram segredo (ou quase, tendo em vista que muitos sabiam desta gangorra solitária que balançava o coração tarsiliano). Até que pós-morte (como sempre, com o que se guarda por não se ter coragem de rasgar coisas do coração selvagem) a filha de Luis e Anna Maria descobriu que o pai mantivera por 18 anos um caso com uma outra mulher. Sim, era ela, a Tarsila das tantas artes: "Abaporu", 1928; "O Lago", 1928; "O Ovo" ou "Urutu", 1928; "A Lua",1928; "Cartão Postal", 1929 e "Antropofagia", 1929.

Aí vai meu coração, não é um livro de fofocas. Ao entrar no universo alheio, de paixões e dores transcritas em cartas antigas, sente-se um aperto no peito por cada página que se vira. Dói um pouco, porque no fundo, sempre imagina-se finais felizes. Descobrimos porém, que a vida não é tão colorida quanto merecia ser e a máxima modernista é mais verdadeira que nunca "só a antropofagia nos une" desde sempre, para sempre.

Um trecho do livro :
“... Eu também tenho momentos de desespero e quero também desabafar para sentir-me mais aliviada, como aconteceu com você. Não quero que você torne a falar em morrer. Essa idéia me é intolerável. Antes venha a morte para mim, o que seria uma solução menos má. Vou deixar esta carta para amanhã. Estou sofrendo demais e, como não posso deixar de ser sincera, poderia concorrer para aumentar sua angústia. As palavras escritas me doeram muito mais do que as faladas: ‘Amo, etc....’ nem quero repetir suas palavras: elas são punhais que se enterram nas feridas do meu coração. Ah! meu querido Luís, mas por que estou eu dizendo estas coisas? Perdoe-me se estou sentindo necessidade premente de expansão. E eu que não quero ser estorvo na sua vida...” Carta de Tarsila do Amaral para Luís Martins datada de 21 de janeiro de 1952, época da separação deles.
( acreditem ou não, mas eu chorei com esta Tarsila, trancada com estas despedidas em algumas noites vazias )

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